segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Crise de criatividade ou política de mercado?

Escrevendo para o blog recentemente e lendo alguns artigos, me dei conta do número extraordinário de filmes que são adaptações, remakes ou simplesmente seqüência. A quantidade de filmes com roteiros originais tem diminuído nos últimos anos em Hollywood.

Adaptações sempre estiveram presentes na história do cinema e fizeram chegar às telas clássicos da literatura que renderam grandes filmes de sucesso. No ranking dos 100 melhores filmes do American Film Institute, 49 foram adaptados ou inspirados a partir de romances, contos e livros de não-ficção. Seja em termos de crítica ou público esses filmes obtiveram grandes êxitos. Vale lembrar de Uma Mente Brilhante (2001), que faturou o Oscar de Melhor filme e a adaptação de um dos livros mais lidos do planeta: Senhor dos Anéis, cuja trilogia rendeu uma bilheteria de quase US$ 3 bilhões de dólares se combinarmos o faturamento mundial dos filmes e 17 Oscars incluindo o de Melhor Filme para o episódio final da saga lançado em 2003.

Mas o que vemos hoje na verdade é uma enxurrada de adaptações que se apropriam de elementos já inseridos e instaurados na cultura de massa como forma de promover o filme antes mesmo do seu lançamento. Adaptações de histórias como heróis de quadrinhos, desenhos animados, seriados de TV e até mesmo jogos de videogame e PC. Podemos citar aqui a trilogia do Homem Aranha, Sin City (2005), os recém-lançados Transformers (2007) e Simpsons – O Filme (2007), a promessa de um novo filme do He-Man, de uma adaptação de Sex and The City, e os recentes Resident Evil (2002) e seqüência e Doom (2005).

Somando-se a isso, temos um número elevado de remakes e seqüência. O remake é uma nova versão de um filme previamente realizado e lançado. O mais notável na história recente provavelmente é Os Infiltrados (2006), de Martin Scorcese, versão de um filme obscuro de Hong Kong que ganhou o Oscar de Melhor Filme no ano passado e Guerra dos Mundos (2005), de Steven Spielberg. Qualquer filme dos últimos anos que tenha feito sucesso imediatamente ganha uma (ou duas) seqüência. Velozes e Furiosos (2001) e suas continuações são um bom exemplo de seqüência fora de propósito que sequer tratam dos mesmos personagens. Transformers (2007) mal foi lançado e já terá uma continuação em 2009.

Diante do número pequeno de filmes citados em relação às possibilidades de preencher muito mais linhas com filmes não-originais de todos os tipos, pode parecer que a afirmação de que Hollywood está vivenciando uma crise de criatividade é verdadeira. Nada poderia ser mais incorreto, porém. Segundo estimativas, o número de roteiros originais registrados anualmente nos EUA pode passar de 80.000. Então porque é que não se produzem mais filmes originais? A resposta é simples. O cinema americano é uma poderosa indústria. Um negócio. E a regra para investir capital em qualquer aplicação é procurar sempre o menor risco aliado às maiores taxas de retorno.

Fica óbvio que investir em uma fórmula de sucesso já testada e comprovada é muito mais seguro e lucrativo para os acionistas dos estúdios de Hollywood. Colocar dezenas de milhões de dólares em um roteiro original pode ser arriscado demais. Utilizar um produto que já está inserido na cultura popular é uma forma de proteger esse investimento ao garantir, aliado a estratégias de lançamento que consomem cada vez mais recursos em publicidade, um grande público para o filme. O público maior também chama a atenção de empresas interessadas em promover seus produtos através do filme. A última aventura de James Bond, Casino Royale (2006), por exemplo, traz a Sony, distribuidora do filme, aparecendo em DVDs, celulares, câmeras, monitores e notebooks. Virtualmente todos os carros que aparecem no filme pertencem ao grupo Ford (incluindo o incrível Aston Martin do 007) e a vodka Smirnoff foi inserida no Martini, o drink imortalizado pelo personagem.

Por último, gostaria de destacar, como contraponto, que ainda há excelentes roteiros originais sendo produzidos e levados às telas todos os anos por produtoras de grande porte e por seus selos “independentes”, como o ótimo Pequena Miss Sunshine (2006), o excelente Mais Estranho que a Ficção (2006) e tantos outros que nos deixam ainda alguma esperança no cinema americano e em sua renovação.

Pra saber mais +

Clique nos links do texto para acessar o IMDB.

Um comentário:

Rodrigo Novaes disse...

Aí vai outra maneira de "proteger" investimentos, talvez com consequências até piores do que os roteiros não tão originais:
http://en.wikipedia.org/wiki/Star_system_(film)